quarta-feira, 10 de julho de 2013

Jardim

Jardim

Em certo jardim do Porto
Onde há poemas pelo chão
Algo existe triste e torto
A afrontar meu coração

Poeta, diz-me, poeta,
Porque ocultas teu olhar?

Canta Nobre, canta Nobre
Para essa gente perdida
Pois mesmo a gente mais pobre
Merece um dia ter vida

Poeta, diz-me, poeta,
Em que estás tu a pensar?

Ó Jesus que estás tão perto
Desta tão ingénua gente,
Põe seu coração desperto
P’ra que não seja descrente

Poeta, diz-me, poeta,
Porque não estás a cantar?

Em certo jardim do Porto
Onde brincam mil crianças
Algo existe triste e torto
A abalar nossas esperanças

Poeta, diz-me, poeta,
Porque fixas meu olhar?

Rapazes cantam tristezas
Ali junto ao hospital
E perdem-se nas fraquezas
Mais próprias dum animal

Poeta, diz-me, poeta,
Porque segues meu andar?

Há lá poetas perdidos
Que na vasta solidão
Versejam despercebidos
Com tremores no coração

Poeta, diz-me, poeta,
O que te faz admirar?

Em certo jardim do Porto
Rodeado de verdura,
Um salgueiro quase morto
Lamenta a sua tortura

Poeta, diz-me, poeta,
Porque estás tu a chorar?

Os cisnes não se levantam
Os homens tristes estão,
Os passarinhos não cantam
E tudo é desilusão

Poeta, diz-me poeta,
Achas grande o teu penar?

Veio uma banda animar
Toda esta tristeza alegre
E, ouvindo a banda tocar,
Um homem, chorando, escreve

Poeta, amigo poeta,
Vem comigo, anda cantar!

José Sepúlveda

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