Jardim
Em certo jardim do Porto
Onde há poemas pelo chão
Algo existe triste e torto
A afrontar meu coração
Poeta, diz-me, poeta,
Porque ocultas teu olhar?
Canta Nobre, canta Nobre
Para essa gente perdida
Pois mesmo a gente mais pobre
Merece um dia ter vida
Poeta, diz-me, poeta,
Em que estás tu a pensar?
Ó Jesus que estás tão perto
Desta tão ingénua gente,
Põe seu coração desperto
P’ra que não seja descrente
Poeta, diz-me, poeta,
Porque não estás a cantar?
Em certo jardim do Porto
Onde brincam mil crianças
Algo existe triste e torto
A abalar nossas esperanças
Poeta, diz-me, poeta,
Porque fixas meu olhar?
Rapazes cantam tristezas
Ali junto ao hospital
E perdem-se nas fraquezas
Mais próprias dum animal
Poeta, diz-me, poeta,
Porque segues meu andar?
Há lá poetas perdidos
Que na vasta solidão
Versejam despercebidos
Com tremores no coração
Poeta, diz-me, poeta,
O que te faz admirar?
Em certo jardim do Porto
Rodeado de verdura,
Um salgueiro quase morto
Lamenta a sua tortura
Poeta, diz-me, poeta,
Porque estás tu a chorar?
Os cisnes não se levantam
Os homens tristes estão,
Os passarinhos não cantam
E tudo é desilusão
Poeta, diz-me poeta,
Achas grande o teu penar?
Veio uma banda animar
Toda esta tristeza alegre
E, ouvindo a banda tocar,
Um homem, chorando, escreve
Poeta, amigo poeta,
Vem comigo, anda cantar!
José Sepúlveda
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